O Barbieheimer explodiu em cor de rosa
- Denis Carvalho

- Jul 26, 2023
- 5 min read
Updated: Jul 29, 2023
Enfim, o dia B chegou. E nessa explosão de sentimentos (tá bom, parei), a necessidade de escrever para organizar essas sensações foi a única saída que encontrei como resposta a quem me pergunta se os filmes são bons mesmo e de qual eu gostei mais.
Isso porque comecei a perceber que a euforia era tanta, que os argumentos passavam pelo meu cérebro mais rápido do que a minha boca conseguia expressar de forma compreensível – que para um comunicador, é algo terrível.

Particularmente, foi uma experiência catártica. Assisti Oppenheimer sendo a cereja do bolo do Corujão do Nolan, no Cine Marquise em São Paulo, que contou ainda com as exibições de Interestellar (2014) e Dunkirk (2017). Cheguei em casa 7h30 da manhã no dia seguinte? Sim, mas valeu a pena! Até ganhei um livro com a biografia do tal inventor da bomba atômica em um sorteio durante as exibições, olha que beleza!
Mas, mesmo com tudo isso - Nolan, sorry, I love you, but – não tem nem o que pensar. Oppenheimer é ótimo, sim, com certeza. Porém, tendo Interestellar facilmente na minha lista de Top 5 de filmes favoritos de todos os tempos – e acho que já vi o próprio Christopher Nolan acenando que este é o seu melhor filme – não dá pra desconsiderar esse ponto. Oppenheimer é um grande filme, mas é “apenas” mais uma grande obra de Christopher Nolan entre praticamente tudo o que ele toca, não sendo nem a sua melhor produção.

Já com Barbie a história é diferente. Não que Barbie também não possa vir a ser a grande obra de Greta Gerwig, que desde sua época de mumblecore – movimento do cinema estudantil nova-iorquino dos meados de 2010, com produções de baixíssimo orçamento, com viés mais pessoal, roteiro aberto e produzido entre amigos - com Frances Ha (2012), por exemplo, já demonstrava uma sensibilidade notável, seja na escrita, atuação ou direção. E nessa ascensão, que passa por Lady Bird (2017) e Little Women (2019), por mais que soe como uma consolidação, com 3 indicações ao Oscar na bagagem já, é excitante pensar o que ela ainda pode (e provavelmente deve) mostrar depois do que fez com Barbie.
Antes de qualquer tipo de aprofundamento, um aviso: não se engane! Todo tipo de brisa filosófica e social aqui ainda acontece dentro do sistema capitalista e já sabemos muito bem a quem ele serve, ok?
Dito isso, o fato de haver uma cisão nos comentários sobre o filme é uma evidência do tipo de estrutura em que ela mexeu. Enquanto Oppenheimer talvez puxe uma discussão mais próxima sobre o nível de culpabilidade do protagonista em relação a criação efetiva da bomba atômica, dificilmente o debate será sobre o espectador ter gostado ou não do filme (que tem nota 8,8 no IMDB e está atualmente em 1º lugar no ranking de popularidade do site). Do outro lado, o filme da Mattel mexe com questões que te fazem ter que refletir bem sobre qual pode ser a origem do comentário de quem gostou e de quem não gostou, especialmente entre progressistas e conservadores.

O filme que causou escassez de tinta rosa no mundo durante seu processo de produção – true story – e excesso da mesma cor nos looks de quem lotou as salas de cinema, usou a própria história do produto, da marca, para um “acerto de contas” com o seu passado. A liberdade criativa confiada a Greta pela Mattel, de permitir colocar tanto a marca quanto a própria Barbie em xeque, numa posição antagônica na prática daquele discurso de empoderamento feminino que se propunha, é notável. Méritos totais a Gerwig pela confiança conquistada.
Em tempos de lutas por reparações históricas e certos avanços de pautas progressistas, a narrativa do filme é capaz de reposicionar a marca em um novo patamar, admitindo cicatrizes de seu passado, podendo até vir a ser finalmente o tal símbolo de empoderamento na luta contra o patriarcado, e ainda ser uma obra extremamente divertida (isso se você não for um homem branco hétero conservador) e falar de assuntos sérios como saúde mental e relações tóxicas.
O roteiro e a direção de Greta são dignos não só de mais indicações, mas merecendo demais levar as estatuetas desta vez. As performances do elenco estão ótimas também - com destaque, claro, para Margot Robbie, Ryan Gosling e Will Ferrell.
O senso de humor e o drama impressos estão misturados na medida certa. Você ri, se emociona, vibra. É impossível sair apático do cinema!
Lembrando ainda as aulas do curso de Dramédia para Séries, com João Pedro Pinho na Roteiraria, a não-negação da disforia para fazer o filme da boneca mais famosa do mundo foi essencial para transformá-la no fenômeno que é, com aceitação positiva por um público cada vez mais amplo a esse tipo de produção, inclusive em terras brasileiras.
Como roteirista, fico na esperança de que os players também percebam isso e fiquem mais suscetíveis a darem sinal verde para produções de dramédias nacionais, ao invés torcerem o nariz porque o projeto está “Fleabag demais”. Afinal, se há um povo no mundo que possa ser a encarnação da essência do que é uma dramédia, é o brasileiro!

Tanto é, que, apesar das controvérsias e polêmicas, Barbie arrecadou praticamente o dobro que Oppenheimer, fazendo US$ 162 milhões contra US$ 82 milhões no primeiro final de semana, batendo recordes de bilheteria nos EUA, no Brasil e globalmente, mostrando que o capitalismo sempre encontra um jeito.
Tentando transitar entre otimismo e realidade, já que o sistema ainda é esse mesmo enquanto a gente não o derruba, o fenômeno Barbieheimer também pode ser uma resposta a quem já coloca no horizonte a derrocada das salas de cinema tradicional. Sim, o custo de ingressos, pipoca, estacionamento e tudo mais, que conferem ao evento de sair de casa e ir ao cinema está altíssimo, porém ainda é relevante, tem apelo e movimenta milhões.
Enquanto for possível criar fatos como esses, que ao invés de ser um duelo como muitos pensam, foi uma estratégia de marketing conjunto excelente - afinal, uma mão lava a outra - sobreviveremos. Blockbusters, grandes franquias e produtos altamente comerciais audiovisuais contribuem para sustentar as estruturas das produções mais artísticas e independentes que não dão tanto retorno comercial. Fazer o quê, né?

Acredito que não haverá um fim para as salas de cinema, mas uma reorganização da forma de se administrar esses espaços, incluindo mais presença do Estado, consequentemente podendo baratear os custos para consumidores, mas isso é papo pra outro texto.
Olha quanta coisa Barbie foi capaz de mexer e provocar (incluindo eu voltar a escrever neste blog)! É neste contexto do quão impactante a obra alcançou que o debate de qual é melhor não deveria nem existir.
Então, se ainda não foi, vá assistir Barbie, vá ver Oppenheimer, e veja com seus próprios olhos, sinta com seu próprio coração (se não for aquariano) o porquê do Barbieheimer ter definitivamente entrado no Zeigeist, mas destacado com caneta cor de rosa.
















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